Opinião
Decreto-Lei da Impunidade
2022-07-12 09:48:33
O XXIII Governo Constitucional prepara um decreto-lei para legislar sobre a impunidade das suas incompetências. Será o resultado de diversos “diplomas” assinados por vários ministros, suportados pelo primeiro-ministro e que tem, invariavelmente, acabado por serem promulgados pelo Presidente da República.
Se os momentos difíceis têm sido justificados pelo Governo com a pandemia, a guerra, a inflação e outros tantos fatores que têm afetado transversalmente o mundo, os frequentes e consecutivos casos graves que tem acontecido, só podem dar origem a legislação de forma que a incompetência possa ser lei e desobrigar os governantes inaptos e incapazes de todas e quaisquer responsabilidades.
Há centenas de casos sem que as consequências revertam para os principais responsáveis, mantendo-se impunes e nos seus lugares.
Em 2017 os incêndios de Pedrógão Grande destruíram mais de 50 mil hectares de floresta e causaram 66 mortos. Não há responsabilidades pelas inúmeras falhas neste processo, a desorientação total foi a principal causa da morte de 47 pessoas na EN 236. Podem existir inúmeros culpados, agora, responsabilidades políticas nem vê-las.
Em 2020 um ucraniano de 40 anos aterrou em Lisboa, na bagagem trazia apenas a esperança de encontrar um trabalho que lhe permitisse sustentar a família que ficou na Ucrânia. Não chegou a sair do aeroporto. Morreu dois dias depois às mãos de inspetores do SEF que o espancaram e torturaram. Culparam-se, acusaram-se e condenaram-se os executores, mas, politicamente, a única conclusão a que chegaram é que deveriam colocar nas salas do SEF um botão de pânico.
Ainda antes de terminar 2020, fica-se a saber que o Ministério da Justiça contraria uma escolha de um comité de peritos e indica para o cargo de procurador europeu uma outra escolha com base em falsidades que constavam no seu CV e que, acabaram por permitir a sua nomeação para procurador europeu nacional na Procuradoria da União Europeia, órgão independente de combate… à fraude. Politicamente não passou de uns “lapsos”.
Em 2021 uma viatura oficial que transportava o Ministro da Administração Interna, o mesmo que tinha sob sua tutela o SEF e a Proteção Civil, seguia em excesso de velocidade na A6 e acabou por atropelar um trabalhador, causando-lhe a morte. A responsabilidade foi atribuída ao motorista. O Ministro manteve-se politicamente imaculado.
Em 2022 o SNS entra em colapso. O desinvestimento escondido nas cativações, o fim de PPP de sucesso, por questões ideológicas, como o Hospital de Braga e ausência de reformas estruturais encerra urgências por todo o país, instala-se o caos nos serviços de ginecologia e obstetrícia criando terror a cada gravidez. Politicamente a responsabilidade passou por nomear uma comissão de acompanhamento e pedir aos portugueses que não fiquem doentes em agosto.
Na semana passada, um ministro anunciou dois novos aeroportos para Lisboa, o primeiro-ministro mostrou-se surpreendido e revogou a decisão. O medo das consequências para o partido, leva à aceitação de troca de um pedido de demissão por um pedido de perdão. Politicamente tratou-se apenas de um erro de comunicação.
Deve estar para breve o Decreto-Lei da Impunidade e, com toda a certeza, que terá efeitos retroativos desde o final de 2015.
Nuno Catita
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