Edição: 281

Diretor: Mário Lopes

Data: 2024/4/27

Após o ICNF plantar pinheiros no Perímetro Florestal da Serra de Montejunto

Alambi insta ICNF a plantar floresta autóctone em vez de pinheiros na Serra de Montejunto

Cartaz da ICNF junto à zona da recente plantação de pinheiros

A Direção da Alambi – Associação para o Estudo e Defesa do Ambiente do Concelho de Alenquer enviou uma carta ao ICNF- Instituto da Conservação da Natureza e Florestas, no dia 22 de julho, a propósito da recente plantação de pinheiros no Perímetro Florestal da Serra de Montejunto pelo ICNF, em que reclama a plantação de espécies autóctones, em vez de pinheiros, por razões ambientais e minimizar o risco de incêndios.

A Serra de Montejunto entrou em Regime Florestal Parcial em 1910, sendo apropriada pelos Serviços Florestais. Por essa altura a Serra estava despida de arvoredo, depois de séculos de desarborização – relatos da época dizem que as árvores se contavam pelos dedos de uma mão – e os Serviços Florestais, num trabalho diligente que demorou décadas, plantaram ali um imenso pinhal com uma área superior a mil hectares.

A opção por florestar com pinheiros as serras portuguesas que entravam em Regime Florestal, todavia, nada teve a ver com a reconstituição dos ecossistemas destruídos por séculos de arroteias – questão que nem se colocava na época – nem tão pouco a utilização de espécies nativas constituía uma preocupação. Quando os bosques nativos foram completamente dizimados e começou a faltar madeira em Portugal, foi necessário plantar floresta. No Século XIX, os primeiros florestais portugueses, foram à Europa – que se debatia com o mesmo problema – estudar o que por lá estava a ser feito e, aplicaram em Portugal as mesmas soluções que ali estavam a ser seguidas.

A Florestação em Portugal teve início pelas dunas do litoral, onde foi plantado sobretudo pinheiro bravo e quando foi necessário passar do litoral para as serranias, foi transposta a boa experiência de décadas a plantar em dunas. O pinheiro, como espécie pioneira, adaptou-se bem a serranias de solos empobrecidos pela erosão. E assim, paulatinamente, nasceu a maior mancha contínua de pinhal da Europa.

Em 2003 Montejunto ardeu. Num imenso fogo que durou uma semana, arderam 1700ha, dos quais 950ha de povoamentos florestais, isto é, de pinhal (Relatório Provisório da DGF de novembro de 2003). Segundo o inventário florestal que consta no Projeto de Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem protegida da Serra de Montejunto, datado de 2011, restavam naquela altura em Montejunto 297ha de resinosas, o que permite concluir que o incêndio de 2003 consumiu, de uma só vez, 76 por cento do pinhal que os Serviços Florestais demoraram décadas a plantar.

Este não foi sequer o primeiro fogo a devastar os pinhais de Montejunto. Já o Mestre Florestal Julião Marques, em relatório datado de 1949 informa que «os fogos, de há 15 anos para cá, queimaram umas centenas de hectares».

Recentemente, o ICNF, herdeiro dos Serviços Florestais, realizou uma nova plantação de pinheiros na Serra de Montejunto, opção que a Alambi não pode deixar de questionar.

Em 2003, ano do grande incêndio de Montejunto, arderam em todo o país mais de 400 mil hectares de floresta e matos. Ficou claro, nesse ano que grandes extensões de resinosas fora do litoral, sem pastoreio, sem a roça de matos, sem a recolha de lenha morta, isto é, sem gestão ativa, são altamente vulneráveis ao fogo, constituem um perigo para as populações residentes, são um investimento económico sem retorno e constituem um ecossistema ideal para alimentar grandes fogos no verão.

A Alambi recorda que “o clima está a mudar e tornou-se evidente que o modelo florestal seguido pelos Serviços Florestais para as serras portuguesas durante décadas, assente nas resinosas, já não se adapta ao clima atual e dificilmente se adaptará a um novo modelo climático em que as temperaturas médias podem ser dois ou três graus acima das temperaturas médias atuais.”

“Em serranias como Montejunto, sobretudo nas zonas mais baixas, já foi criado solo capaz de suportar espécies nativas folhosas. Então porquê insistir em espécies resinosas?”, pergunta.

“José Bonifácio de Andrada e Silva e Barros Gomes, pioneiros da florestação em Portugal, andaram anos pela Europa a estudar o que por lá se fazia. Naquela altura as resinosas eram as espécies usadas, mas, entretanto, nesses países, os conceitos evoluíram e passaram a ser usadas também outras espécies. Será que a gestão florestal em Portugal ainda é feita à maneira do século XIX?”, questiona.

A Paisagem Protegida da Serra de Montejunto, 24 anos depois da sua constituição, não tem ainda Plano de Ordenamento e Gestão, o que pode constituir uma dificuldade ao seu ordenamento florestal, nomeadamente às opções de reflorestação. Todavia, se não existe Plano de Ordenamento, existem outros documentos oficiais que devem ser seguidos.

“Em 1957 os Serviços Florestais elaboraram um Projeto de Arborização de Perímetro Florestal da Serra de Montejunto no qual previam percorrer por sementeira e plantação de folhosas, 554ha das zonas de melhores solos, algumas das quais foram agora plantadas com pinheiros. Este projeto, muito avançado para a época, lamentavelmente, está esquecido nos arquivos do ICNF e, no que diz respeito ao aumento da área de folhosas, nunca foi implementado”, critica.

O Inventário florestal realizado em 2011 para o Projeto de Plano de Ordenamento e Gestão nunca aprovado, quantifica em 55,6ha a área de diversas folhosas de porte arbóreo, de entre as quais carvalhos, sobreiros, castanheiros e carrascal arbóreo, em várias zonas da Serra. A área de folhosas na Serra de Montejunto em 2011 era apenas 10 por cento da área que os Serviços Florestais previam plantar no Projeto de Arborização de 1957, 54 anos atrás.

Por sua vez, o Plano Sectorial da Rede Natura 2000 da Serra de Montejunto estabelece como orientações de gestão, ações «dirigidas prioritariamente para a recuperação de diferentes habitats, promoção do carvalhal, dos habitats rupícolas e dos biótopos de alimentação dos quirópteros». Assim, conclui a Alambi, “é a plantação de carvalhos que a o Plano da Rede Natura manda realizar, não é a plantação de pinheiros.”

Também o Oeste PIAAC, um documento de adaptação às alterações climáticas para a Região, elaborado a partir dos trabalhos do IPCC, por encomenda da Comunidade Intermunicipal do Oeste recomenda, como ações de adaptação, a elaboração de um manual de boas práticas florestais para a plantação, manutenção e gestão de povoamentos de variedades autóctones (pág. 307), a atribuição de prémios a proprietários florestais que replantem áreas ardidas com espécies autóctones (pág. 308), e, mais à frente, em Linhas de Intervenção, recomenda às Câmara Municipais associadas, «em sede do processo de revisão dos PDM, fomentar a diversificação de povoamentos florestais, nomeadamente através de espécies autóctones, destacando-se os carvalhos perenifólios (sobreiros e azinheiras) e, simultaneamente, desincentivar as monoculturas e o recurso a espécies potencialmente invasoras e nocivas para os ecossistemas naturais».

Embora este documento não tenha sido elaborado para a Serra de Montejunto, a Serra está integrada no território da Região Oeste e, o seu ordenamento florestal, deve seguir as linhas orientadoras que ali são estabelecidas.

“Apesar de, volvidos 24 anos da sua criação, a Paisagem Protegida não ter ainda Plano de Ordenamento, a verdade é que existem pelo menos três documentos orientadores que lhe são aplicáveis e a recente plantação de pinheiros realizada pelo ICNF não segue as linhas orientadoras estabelecidas em nenhum destes documentos. Pelo contrário, enquanto o Projeto de Arborização de 1957 previa percorrer com folhosas zonas de pinhal, na recente florestação realizada pelo ICNF foram plantados pinheiros em zonas onde começam a surgir carvalhos”, lamenta a Alambi.

“Em nosso entender os 1500ha do Perímetro Florestal da Serra de Montejunto sob responsabilidade do ICNF, não devem ser geridos de forma casuística, ao sabor do que cada equipa técnica entende por bem fazer. Na ausência de um Plano de Ordenamento e Gestão da Paisagem Protegida, existem outros documentos orientadores e é o que está estabelecido nesses documentos que deve ser seguido”, recomenda.

Assim, a Alambi vem, com esta carta, convidar o ICNF a corrigir o erro que cometeu e a substituir os pinheiros ali plantados por árvores das espécies referidas nos documentos que se aplicam a Montejunto.

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