Edição: 281

Diretor: Mário Lopes

Data: 2024/4/27

Segundo o Marine Stewardship Council

Aquecimento dos mares no Atlântico Nordeste pode prejudicar as principais populações de peixes

Banco de peixes em águas profundas do Oceano Pacifico

O Marine Stewardship Council (MSC), Organização Não Governamental que estabelece uma norma global para a pesca sustentável, alerta que a onda de calor marinho que está a registar temperaturas recorde no Atlântico Norte, aliada ao aquecimento dos mares, que resulta da aceleração das alterações climáticas, pode ter um impacto devastador, afetando as espécies icónicas de peixes pelágicos no Atlântico Norte.

Espécies como a cavala, o arenque atlanto-escandinavo e o verdinho dependem das águas mais frias do Atlântico Norte para se reproduzirem e manterem populações saudáveis. No entanto, o aquecimento dos mares poderá limitar a sua capacidade de desova, conduzindo a uma diminuição do número de peixes e afetando, significativamente, o fornecimento de produtos do mar e os ecossistemas oceânicos [1].

O aquecimento dos mares pode também influenciar a deslocação dos peixes para norte, em direção a temperaturas mais frescas, pelo que é importante que os Governos trabalhem em conjunto, para além das suas fronteiras nacionais, a fim de assegurarem uma monitorização e uma gestão eficazes das populações de peixes partilhadas.

Estas espécies já estão a ser sobre-exploradas porque as principais nações pesqueiras, como o Reino Unido, a Noruega, a UE, a Islândia, as Ilhas Faroé, a Gronelândia e a Rússia, não conseguem chegar a acordo sobre as quotas de pesca totais em conformidade com os pareceres científicos. Este impasse político, associado ao aquecimento dos mares, que empurra os peixes mais para norte e altera os seus padrões de distribuição, está a criar a tempestade perfeita que coloca em risco a saúde futura destes importantes stocks de peixes.

À medida que os mares se tornam mais quentes e as ondas de calor marinhas mais frequentes [2], os Governos devem dar prioridade à gestão sustentável destas unidades populacionais, por forma a garantir a sua resistência aos impactos das alterações climáticas.

Caso não consigam chegar a acordo, no que toca a estratégias de gestão pesqueira inteligentes, do ponto de vista climático, as consequências para as populações de peixes serão ainda mais graves. As investigações concluíram que o aquecimento dos mares, incluindo as ondas de calor marinhas, reduziu algumas populações de arenque atlanto-escandinavo em 40%, entre 2005 e 2015 [3].

O Dr. Olav Sigurd Kjesbu, cientista principal do Instituto de Investigação Marinha da Noruega, afirmou: «Sabemos que estas espécies pelágicas são sensíveis às mudanças de temperatura. Já vimos que o clima afeta a sua distribuição, a sua capacidade de desova e as suas taxas de mortalidade. O rápido aquecimento dos mares poderá acelerar estas alterações. Com base em análises recentes, poderão também ter um impacto significativo na capacidade de reprodução do arenque e do verdinho».

Os cientistas estão preocupados com o facto de que, caso a atual onda de calor marinha no Atlântico Norte se mantenha, poderá repetir o impacto de ondas de calor marinhas semelhantes, ocorridas  em todo o mundo. Tanto a onda de calor marinha de 2011, na Austrália Ocidental [4], como a de 2014-2016 na Costa Oeste dos EUA [5], reduziram as populações de peixes a tal ponto que as pescarias fecharam durante mais de três anos para ajudar a reconstituir as populações de peixes.

O Dr. Christopher Free, do Instituto Marinho da Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara, afirmou: «Na última década, as ondas de calor marinhas afetaram as pescas em todo o mundo. Se as condições no Atlântico Norte se mantiverem quentes, podem avizinhar-se catástrofes semelhantes.»

O fenómeno El Niño, que, segundo as previsões, vai provocar ondas de calor em 50% dos oceanos até setembro [6], já levou a maior pescaria pelágica do mundo, a pescaria peruana de Anchoveta, a cancelar a campanha de pesca deste ano [7].

Erin Priddle, Diretora Regional do MSC para a Europa, afirmou: «Os responsáveis políticos têm de encontrar uma forma de incorporar as mudanças nas unidades populacionais, como a alteração da distribuição dos pelágicos do Atlântico Nordeste, em planos de gestão pesqueira sólidos e a longo prazo. Sem um planeamento conjunto e eficaz, os nossos recursos haliêuticos podem ser colocados em risco de sobre-exploração, sobrepesca e mesmo de rutura das populações de peixes. Veja-se o exemplo do arenque atlanto-escandinavo na década de 1960 [8], em que a sobrepesca e a má gestão da unidade populacional tiveram enormes consequências económicas e sociais, com a falência de muitas empresas de pesca e de transformação de arenque e a perda de milhares de postos de trabalho. Com as mudanças políticas e ambientais ainda maiores que se avizinham, temos de aprender com o passado e garantir que a gestão das pescarias esteja preparada para o clima, seja resiliente e se adapte às mudanças.

Referências:

  1. Fernandes, J.A., Frölicher, T.L., Rutterford, L.A. et al. Changes of potential catches for North-East Atlantic small pelagic fisheries under climate change scenarios. Reg Environ Change 20, 116 (2020). https://doi.org/10.1007/s10113-020-01698-3 e Maik Tiedemann et al., Environmental influences on Norwegian spring-spawning herring (Clupea harengus) larvae reveal recent constraints in recruitment success, ICES Journal of Marine Science, Volume 78, Issue 2. Março de 2021, pp. 640–652, https://doi.org/10.1093/icesjms/fsaa072
  2. As alterações climáticas estão a tornar as ondas de calor marinhas mais comuns, citado em Front. Sci., 07 August 2019 Sec. Global Change and the Future Ocean Volume 6 – 2019 | https://doi.org/10.3389/fmars.2019.00484
  3. A ausência de uma classe anual de recrutamento abundante de arenque norueguês de desova primaveril (NSS) (parte da espécie de arenque atlanto-escandinavo) entre 2005 e 2015 contribuiu para uma redução aproximada de 40% na biomassa da população reprodutora desde 2009, ou seja, de 7 para 4 milhões de toneladas, causada pelo aquecimento dos mares do Atlântico Norte. Maik Tiedemann et al., Environmental influences on Norwegian spring-spawning herring (Clupea harengus) larvae reveal recent constraints in recruitment success, ICES Journal of Marine Science, Volume 78, Issue 2. Março de 2021, pp. 640–652, https://doi.org/10.1093/icesjms/fsaa072
  4. Caputi Nick, Kangas Mervi, Chandrapavan Arani, Hart Anthony, Feng Ming, Marin Maxime, Lestang Simon de. Factors Affecting the Recovery of Invertebrate Stocks From the 2011 Western Australian Extreme Marine Heatwave. Frontiers in Marine Science. 2019.

https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fmars.2019.00484

  1. Impacto da onda de calor marinha de 2014-2016 nas pescarias da costa oeste dos Estados Unidos e do Canadá: surpresas e lições dos principais estudos de caso. Christopher M. Free, Sean C. Anderson, Elizabeth A. Hellmers, Barbara A. Muhling, Michael O. Navarro, Kate Richerson, Lauren A. Rogers. 20 de abril de 2023. https://doi.org/10.1111/faf.12753
  2. https://research.noaa.gov/2023/06/28/global-ocean-roiled-by-marine-heatwaves-with-more-on-the-way/
  3. Peru cancels all-important first anchovy fishing season | IntraFish.com
    https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0313592622000078

O Marine Stewardship Council (MSC) é uma organização internacional sem fins lucrativos que estabelece padrões reconhecidos a nível mundial para a pesca sustentável e a cadeia de abastecimento de produtos do mar. Pescarias que representam 19% das capturas marinhas selvagens do mundo estão envolvidas no programa de certificação do MSC. Para mais informações, visite o nosso site em msc.org.

     Fonte: BCW

 

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