Edição: 281

Diretor: Mário Lopes

Data: 2024/4/19

Opinião

Surpresa ou talvez não

Nuno Catita

Todos os dias somos surpreendidos com a capacidade do ser humano em ultrapassar a barreira da imoralidade, da deslealdade, da falsidade e do logro. Dá-nos a ideia da existência de uma competição sem regras, em que o prémio mor será entregue a quem provar maior capacidade para a vigarice.

Estes últimos dias estão cheios de exemplos.

No Alentejo os artesãos que confecionam as tradicionais samarras e capotes alentejanos foram surpreendidos com cartas de um advogado que, representa um engenheiro civil lá prós lados de Penafiel, dando conta de ter registado estes artigos típicos e centenários no Instituto Português de Propriedade Industrial. Este engenheiro civil não convenceu os artesãos, mas conseguiu convencer o organismo público que é responsável pelo registo e concessão de marcas, patentes e desenhos ou modelos em Portugal, que, imaginem, validou o pedido de registo.

Indo dos capotes à Via Verde, que é o sistema que nos deu liberdade para circular pelas estradas onde existe cobrança de portagens. Este sistema é de uma criatividade ímpar dos portugueses, habituamo-nos a esta comodidade fantástica à troca da compra ou de um aluguer de um identificador. Atrás das portagens, “ofereceram-nos” a facilidade de pagamento do estacionamento, do abastecimento, do carregamento de viaturas elétricas e até do pagamento no McDrive. Sabemos agora, que, a partir de janeiro, quem quiser continuar a usufruir de todos os serviços terá de pagar mais.

Ainda no segmento das estradas, também foi agora que as Infraestruturas de Portugal anunciaram que tudo está pronto para o arranque das obras no IC2, entre Benedita e Rio Maior, e já no mês de janeiro. São 20 km de requalificação, com um custo de 8,4 milhões de euros, que durará 450 dias e, depois de tantos anúncios, será iniciado no mês escolhido pelo Presidente da República para as eleições legislativas. Apenas lá no fundo, mas mesmo no fundo, se pode acreditar neste anúncio, e só porque tudo tem de ter um limite, uma vez que permitir que o estado do piso continue a provocar acidentes e parte deles com consequências muito graves, é um acto criminoso.

Em poucos dias, três exemplos da falta de respeito e total abuso. O primeiro de alguém que, pessoalmente, pensou num esquema para registar bens tradicionais como sendo sua a patente, o segundo, uma empresa privada que, num abuso da exclusividade, vai cobrar pelos serviços que foi disponibilizando e habituando os clientes ao longo dos tempos e, por último, uma empresa pública, que tem vindo a enganar os utentes do IC2 e é agora utilizada, descaradamente, para campanha política.

Por este caminho, e por mais inacreditável que seja, começa a ser difícil ser surpreendido por esta total falta de respeito.

   Nuno Catita

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